#69 A serviço da tributação justa
#68 OCDE falhou: abuso fiscal global escala para meio trilhão
Convidadxs

Anualmente, o É da Sua Conta homenageia nossos heróis e heroínas invisíveis que trabalham na administração tributária. A natureza do caráter de atividade essencial destes profissionais, que garantem a arrecadação de recursos estabelecida pela Constituição, contrasta com a falta de valorização e de contratações para dar conta do trabalho na Receita Federal e nos fiscos estaduais e municipais.

Além de fiscalizar e autuar grandes corporações que podem sonegar bilhões de reais, o trabalho de nossos heróis invisíveis contribui para que micro e pequenas empresas fiquem em dia com o fisco através da educação fiscal. Estes são os temas do episódio #69 do É da Sua Conta.

Ouça no episódio #69:

  • Combate ao planejamento tributário e a sonegação bilionárias: tarefa de auditores fiscais federais
  • Reivindicações dos auditores fiscais da Receita federal, em greve desde 26 de novembro de 2024
  • A necessidade da recriação da Escola de Administração Tributária (ESAF)
  • Fronteiras em colapso: estudo do Sindifisco Nacional mostra que pelo menos 12 áreas de fronteiras estão abertas e sem nenhuma presença aduaneira por falta de estrutura e profissionais
  • Como heróis invisíveis atuam na autorregularização de pequenas e micro-empresas em Goiás

“Quando a gente tiver um sistema que cobre menos dos mais pobres e mais dos mais ricos a gente vai ter efetivamente um sistema tributário alinhado com a Constituição Federal. Aplicar um sistema tributário justo valoriza o auditor fiscal e a instituição da administração tributária e aduaneira do país.”
~Dão Pereira dos Santos, Sindifisco Nacional

“Após educação fiscal, percebemos que houve melhor conformidade na estruturação contábil, nos registros e acompanhamentos dos pequenos contribuintes que puderam se beneficiar da autoregularização.  ”
~ João Arlindo dos Santos, auditor fiscal do Fisco Estadual de Goiás

Transcrição

Daniela Stefano: Grazi, como foi o seu recesso de fim de ano?

Graziele David: O meu foi ótimo, teve muita festa em família, rever parentes e amigas que não via há 5 anos. E teve uma vila de natal na minha cidade, que é algo que eu sou absolutamente fascinada, então fiquei bem feliz.

Dani: Ah, o meu foi massa! Teve praia, amigues, família, museus… descansei bastante… Mas quando voltei a pensar em justiça fiscal, percebi que no É da sua conta a gente não encerrou o ano de maneira tradicional…

Grazi: Verdade Dani! Mas podemos começar 2025 falando de nossos heróis e heroínas invisíveis.

Música É da Sua Conta

Grazi: Oi, boas vindas ao É da sua conta, o podcast mensal sobre como consertar a economia para que ela funcione para todas as pessoas e o planeta. Eu sou a Grazielle David.

Dani: E eu a Dani Stefano. O É da sua conta é uma produção da Tax Justice Network, Rede Internacional de Justiça Fiscal. Você encontra a descrição completa e pode ouvir os episódios anteriores em www.edasuaconta.com e nos mais populares tocadores de áudio digital.

Música

Grazi: Auditores fiscais a serviço da tributação justa é o tema do episódio #69 do É da Sua Conta

vinheta

Dani: Desde 2021 o É da Sua Conta busca divulgar e homenagear o trabalho silencioso das pessoas que atuam nos bastidores para que a tributação aconteça. Auditor fiscal, técnico alfandegário, cobrador de impostos. Sem essas  trabalhadoras e trabalhadores não teríamos arrecadação de receitas para  o Estado criar e executar políticas públicas que fazem nossa vida melhor,  como educação, saúde, saneamento básico, estradas e muitas outras.

Grazi: Neste episódio #69, você vai ouvir sobre a importância da valorização destes profissionais, que contrasta com o descaso com que vem sendo tratados.  E também sobre como o trabalho de nossos herois invisíveis contribui para que micro e pequenas empresas fiquem em dia com o fisco.

Dani: Outras histórias de nossos heróis invisíveis podem ser ouvidas nos episódios 32, 33, 44 e 56. Se você quiser ouvir, de novo ou pela primeira vez, eles estão disponíveis em www.edasuaconta.com ou no seu tocador de áudios favorito.

Música

Grazi: Como auditor fiscal desde 1995, o Dão Real Pereira dos Santos é um de nossos herois invisíveis.

Dão Real Pereira dos Santos: A valorização do auditor fiscal da Receita Federal do Brasil implica também numa luta, num trabalho, pelo fortalecimento da instituição da administração tributária e aduaneira.

Dani:  O  Dão foi eleito pela categoria e, em janeiro de 2025, asusmiu a presidência do Sindifisco Nacional, que é o sindicato dos auditores fiscais da receita federal. Mas antes, ele já foi presidente do Instituto de Justiça Fiscal e é  um grande defensor da tributação dos super ricos.

Dão: É um trabalho invisível. Estar fazendo cobranças, auditorias, investigações, fiscalizações de grandes fraudes, de grandes planejamentos abusivos no campo tributário e autuando, fazendo cobranças de valores, muitas vezes que passam da casa dos bilhões de reais.

Grazi: O trabalho invisível destes profissionais é essencial para a garantia das políticas públicas,  dos direitos sociais, para o financiamento da educação, da saúde e da previdência, por exemplo. Entretanto, se as condições de trabalho de nossos heróis e heroínas invisíveis estão precarizadas no Brasil, isso significa que toda a sociedade sofre, já que precisamos do bom trabalho deles para o bom funcionamento de todos os serviços públicos. Desde 26 de novembro e até o dia em que gravamos este episódio, na última semana de janeiro de 2025, a categoria estava em greve pra exigir melhores condições de trabalho e diálogos com o governo para o cumprimento de direitos que haviam sido prometidos em 2016.

Dão: Isso significa um descaso com a atividade e isso é muito perigoso. Porque a Constituição entendeu que esta atividade é uma atividade estruturante do próprio Estado, que sem recursos arrecadados sem fiscalização da sonegação, sem o combate ao contrabando e ao descaminho as outras atividades do Estado não funcionam. Inclusive os reajustes de servidores: também não têm recursos para serem concedidos se a administração tributária não funcionar.

Dani: Uma das boas notícias para a Receita Federal e, portanto, pra arrecadação de tributos no Brasil foi a contratação de mais de 1200 pessoas para os cargos de auditor e analista fiscal. Para se tornar um servidor público no Brasil, é necessário realizar uma prova de conhecimentos, o concurso. Acontece que o  concurso anterior para analista e auditor fiscal tinha sido em 2014 e desde então a Receita Federal só perdeu servidores.

Dão:  E  a complexidade dos assuntos a serem fiscalizados se ampliaram. Ou seja, o volume de negócios, de atividades econômicas que precisam ser fiscalizadas, aumentou muito nessas últimas décadas.

Grazi: De acordo com o Dão, em 2014, havia cerca de 13 mil auditores fiscais na Receita Federal. Atualmente, são cerca de 7.500, uma redução de 42%.

Música

Dani: Para que a Receita Federal funcione de maneira a cumprir com seu papel constitucional, de realizar uma tributação justa, é preciso que servidores públicos estejam devidamente capacitados. Mas a Escola de Administração Fazendária, a ESAF, foi extinta durante o governo Bolsonaro.

Dão: Para enfrentar os grandes e os maiores planejamentos tributários, normalmente realizados por multinacionais é preciso efetivamente ter grandes conhecimentos técnicos, contábeis temáticos setoriais para poder enfrentar as teses jurídicas que são colocadas aí para evadir tributos. Entendemos que a capacitação é um dos elementos essenciais para o funcionamento da administração tributária e aduaneira. É fundamental para o Brasil dispor de uma escola fazendária. Em todos os países de forma geral, as instituições tributárias mantêm suas escolas, que são as escolas de aperfeiçoamento, são as escolas que promovem em geral, a inovação dentro daquela área.

Grazi: O episódio 56 do É da Sua Conta foi dedicado ao tema das escolas de heróis tributários e da importância da recriação da ESAF. A Escola de Administração Fazendária também realizava o concurso para a admissão de novos servidores. Isso significa que o concurso realizado em 2024 e que chamou mais de 1200 pessoas para trabalhar na receita foi feito por uma instituição privada. E o Dão visualiza um perigo na formação de auditores por escolas particulares:

Dão: Quando a gente fala de formação de servidores públicos por escolas privadas a gente tem que tomar um certo cuidado para ver se esta formação está alinhada com aquilo que a Constituição  estabeleceu como modelo de Estado para o Estado brasileiro. Por exemplo falar de tributação a partir de um viés distributivo, isso está na Constituição. Mas ao longo do tempo, quando a gente vai percebendo que a formação interna dos auditores fiscais da administração tributária e aduaneira vai sendo realizada mais por escolas privadas do que por escolas de governo, pode sim haver uma mudança de concepção. Pode até ser perigoso isso do ponto de vista de defesa dos interesses públicos defesa das políticas públicas né?

Dani: É fundamental que a formação de novos auditores, capacitação contínua e concursos públicos para a contratação de servidores sejam feitos por uma instituição pública:

Dão: A forma como se transmite o conhecimento ou como se forma o servidor público tem muito a ver com a concepção de Estado que está se tentando construir. Uma escola vinculada à administração tributária e uma escola, de certa forma, integrada com as melhores práticas internacionais. Ele estrutura, ele modela o formato do Estado brasileiro. E a instituição pública está vinculada à concepção de Estado que consta na Constituição, portanto uma escola pública, vai formar servidores públicos para servirem aos princípios e aos objetivos constitucionais.

Grazi: A recriação da ESAF é uma das bandeiras do Sindifisco Nacional, também para garantir que a arrecadação seja mais justa e esteja a serviço de toda população:

Dão: A autoridade tributária e aduaneira do país precisa atuar permanentemente como um defensor e guardião dos princípios e objetivos constitucionais. E, ao longo do tempo se a gente perde  esta natureza, esse caráter de servidor público, e passamos a ter uma administração tributária exercida e praticada por técnicos tributários e não por servidores públicos tributários, a gente pode sim ter um risco de enfraquecimento, dos  e dos objetivos constitucionais.

Vinheta

Dani: Mas é preciso contratar mais guardiões dos princípios e objetivos constitucionais. O Sindifisco lançou um estudo chamado Fronteiras em Colapso, que mostra as fragilidades do Brasil em relação às áreas de fronteiras. O relatório mostra inclusive que 12 pontos estão extremamente vulneráveis e abertos à livre ação do crime organizado, contrabandos e tráficos de pessoas e mercadorias ilícitas. O Estado do Mato Grosso do Sul lidera em pontos vulneráveis, com seis municípios fronteiriços onde é preciso instalar inspetoria ou alfândega da Receita Federal nesses lugares.

Dão: A falta de controle é, de certa forma, inconstitucional porque a Constituição diz claramente que o país precisa se organizar para se desenvolver, para proteger a saúde, proteger o meio ambiente, para gerar empregos quer dizer, e o controle aduaneiro acaba servindo a isso.

Grazi: O controle aduaneiro protege os interesses internos dos países contra interferências indevidas do estrangeiro: produtos que entram sem tributos, ou sem ter passado pelos controles de saúde, meio ambiente, de segurança. Também deve garantir que os produtos que vem de fora paguem a mesma tributação daqueles produtos feitos no país para que a concorrência seja leal. Indiretamente, o trabalho de controle de fronteiras é também uma forma de garantir a produção nacional e, consequentemente, o emprego de trabalhadores e trabalhadoras.  Mas as fronteiras estão em colapso…

Dão: Isso significa, portanto que o Brasil não dá a devida importância à atividade de proteção das fronteiras.

Dani: E o Brasil tem quase 17 mil quilômetros de fronteiras terrestres com  10  países vizinhos. O estudo Fronteiras em Colapso foi entregue ao governo federal:

Dão: A solução para esse problema depende do governo como um todo, porque depende também da realização de novos concursos públicos. É preciso ampliar os quadros justamente para garantir o povoamento dessas áreas.

Grazi: O Sindifisco Nacional acredita que além da contratação, é necessário estabelecer uma nova política de envio de profissionais para as fronteiras terrestres, que precisam estar melhor protegidas.

Dão: Que se realize um estudo para verificar uma nova forma de alocar e de estimular que  autoridades tributárias aduaneiras, possam ficar determinados períodos nessas fronteiras, evidentemente com algum benefício. O benefício de poder voltar para um lugar onde deseja ficar, enfim, com alguma vantagem justamente para que a gente possa atrair para o trabalho nesses locais, as pessoas com maiores experiências, com mais expertise.

Dani: O trabalho exigir bastante experiência, as cidades fronteiriças possuem infraestrutura mais frágil em relação aos grandes centros urbanos. Em geral, são os iniciantes na carreira de auditor fiscal – e portanto, menos experientes, que aceitam o desafio de atuar nestas áreas mais perigosas e afastadas. Mas, de acordo com Dão Real, o secretário da Receita Federal, Robinson Sakiyama Barreirinhas, está sensibilizado com o estudo:

Dão: O secretário da Receita Federal já se manifestou algumas vezes  para a importância de estabelecer novas políticas de lotação desses locais onde se tem flagrantes de crimes, ou seja, o tráfico de drogas, o tráfico de armas, a importação de agrotóxicos proibidos. Tudo isso acontece pelas fronteiras físicas.

Grazi: Além de lutar pela melhora das condições da categoria, o Sindifisco atua também para que a reforma do imposto de renda, que deve ser votada em 2025, seja progressiva, ou seja, que quem ganha menos pague menos e quem ganhe mais contribua com mais.

Dão: Nós precisamos sim interferir no Congresso Nacional, e estamos fazendo isso, para que se eleve o limite de isenção do imposto de renda da pessoa física. Então, nós defendemos sim, que os trabalhadores, que a sociedade que ganha valores mensais, rendimentos, até R$5 mil, até R$ 7 mil, até R$ 10 mil, tenham efetivamente uma redução da sua carga tributária, mas também defendemos que isso tem que ser compensado pela elevação de tributos das altas rendas.

Dani: O Sindifisco tem elaborado e apresentado estudos aos parlamentares em Brasília para que o sistema tributário nacional seja mais justo

Dão: Um sistema tributário mais justo é um sistema progressivo que cobre menos dos mais pobres e mais dos mais ricos. Quando a gente tiver um sistema assim, a gente vai ter efetivamente um sistema tributário alinhado com a Constituição Federal. Entendemos que isso também é um fator de valorização da carreira de auditor fiscal, ou seja, aplicar um sistema tributário justo valoriza a instituição da administração tributária e aduaneira do país.

Música

Grazi: Além dos auditores fiscais da Receita Federal, sobre os quais o Dão falou, também existem também aqueles que atuam nos Fiscos Estadual e Municipal.  Por exemplos, os fiscos estaduais arrecadam o Imposto sobre o comércio de mercadorias e serviços, o imposto sobre a propriedade de veículos automotores e o imposto sobre a transmissão causa mortis e doação. Eles são responsáveis por cerca de 30% das arrecadações do país. E para essa arrecadação estadual estão os auditores fiscais estaduais.

João: Me chamo João Arlindo Gusmão, trabalho como auditor fiscal aqui do Estado de Goiás, desde 1998. Eu gosto de estudar matérias da área tributária, tenho formação em contabilidade, sistema de informação e também fiz mestrados e doutorado ligado a essa área, administração tributária e ciência da informação fiscal tributária. E atuo já na fiscalização em vários setores, também como professor na área contábil tributária.

Dani: João Arlindo, na sua experiência como auditor fiscal em Goiás, qual iniciativa que você destaca por ter promovido a justiça fiscal?

João: Eu tenho participado de um programa que representa bem essa questão da justiça fiscal, que é o programa de autorregularização. Onde a gente identifica irregularidades em contribuintes, mas damos a eles a chance de se autorregularizar espontaneamente, sem imposição de penalidades. Isso tem surtido muito efeito, porque ideia é favorecer o contribuinte que não tem intenção dolosa, ele não quer sonegar, ele não quer fraudar, foi apenas uma falha.

Grazi: As grandes corporações têm o poder financeiro para contratar grandes escritórios de  contabilidade e advocacia, que sabem como os impostos funcionam e fazem planejamento agressivo, isso é, encontram brechas legais para cometer abuso fiscal. Já as pequenas empresas, muitas vezes sequer conseguem pagar por um escritório de contabilidade. Tentam organizar suas finanças sozinhas e podem ter muitas dúvidas sobre os impostos, chegando a cometer sonegação fiscal por falta de conhecimento.

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Maria Lucia: Sou Maria Lucia, sou de Alagoas. Tive lojas aqui em Maceió, pra mim, que eu era pequena comerciante, a minha maior dificuldade em manter as empresas funcionando foram mesmo os impostos. Verdadeiro efeito cascata. Você tem imposto antecipado da mercadoria, tem o imposto quando você vende, tem o imposto do funcionário, tem o imposto da localização. São taxas e mais taxas e você tem que ter um dinheiro guardado.

Dani: Microempresas, com até cinco funcionários, pagam cerca de 65% do faturamento em impostos. As pequenas, com cinco a 19 funcionários, pagam 42%, e as médias, de 20 a 199  funcionários, contribuem com 30%. Agora, as grandes corporações contribuem com muito menos impostos em proporção ao seu faturamento e tem multinacional de bilionário que não paga nada, realizando uso de brechas e paraísos fiscais para abusos.João Arlindo, você tem um exemplo de caso em que a falta de conhecimento de uma pequenas empresa foi resolvida pela atuação de auditores fiscais?

João: Um caso muito específico que a gente tem aqui, são contribuintes de Goiânia, por exemplo, que remetiam mercadorias para a zona da Cidade de Manaus e por algum erro, talvez, na escrituração ou por algum erro, em entender as normas., Permitindo que eles se autorregularizassem, inclusive dando os indicativos, os passos a seguir para os contribuintes que de fato queriam honrar com seu compromisso para com a arrecadação, reconhecendo o valor dela, não tinha intenção de sonegar.

Grazi:  Sua história mostra que o trabalho do auditor fiscal pode ser o de um herói para micro e pequenas empresas, pequenos empreendedores, que têm muitas dúvidas sobre como declarar e contribuir com impostos. Como funciona essa iniciativa?

João: Nesse caso, nós cruzamos campos da nota fiscal com informações fornecidas pela Receita Federal, e outros tipos de cruzamentos também, e identificamos uma falha. O interessante é que a lei, as normas tributárias nos permite já multar, né? Só que ao identificar nesse primeiro momento, o Fisco, ele achou por bem nesse momento, dar uma chance de autor regularização, visando justamente aquela pessoa que não tinha a intenção dolosa.

Dani: Sim, o trabalho do auditor fiscal  também facilita a nossa vida!

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Grazi: O que ocorre a partir do momento que a receita estadual identifica uma intenção óbvia de sonegação fiscal?

João:  Que aqueles que foram identificados nesse momento com a intenção dolosa, por vários outros indícios, né, que demonstravam real intenção de sonegar, promover a concorrência desleal, esses já foram colocados direto no processo de auditoria fiscal e foram autuados .

Dani: E quais foram os  resultados deste programa contra a sonegação fiscal?

João: Neste ano, por exemplo, no levantamento que nós estamos fazendo, estamos percebendo, por exemplo, que os valores, especialmente desses que se autorregularizaram, em especial, pequenos contribuintes, que houve maior compliance, melhor conformidade na sua estruturação contábil, nos seus registros e acompanhamentos.

Grazi: Qual estratégia que, na sua opinião, foi a que mais deu resultados?

João: Uma coisa que surtiu muito efeito foi a orientação. Você monitorar eles por um período, dando chance de se autorregularizar, onde a gente disponibiliza um canal, por exemplo, um e-mail específico, para que eles possam tirar dúvidas e a gente responder aquelas dúvidas ou fazer as notificativas e a gente responde as notificativas também. No caso específico desse exemplo específico da zona franca, nós respondemos todos, todos os e-mails que foram enviados, foi feito um retorno para esse contribuinte.

Dani: A educação fiscal é um super poder para a promoção da justiça fiscal. E neste caso específico que o João está trazendo, é um trabalho invisível, já que é uma orientação individualizada às pessoas e pequenas empresas para não cometerem abuso fiscais involuntários. Falando em educação… como é a formação dos auditores fiscais estaduais para a promoção da educação e da justiça fiscal?

João: Eu participo dessas capacitações, já fiz várias, sou entusiasta pela área da educação e tive a oportunidade de participar também no processo de capacitação de alguns auditores. E lá a gente fala muito de buscar a verdade. Porque para haver a justiça, tem que se chegar na verdade. E a verdade está na prova. E nesses processos de capacitação, habilita o auditor Identificar situações, por exemplo, em que, na verdade, o contribuinte não tinha essa intenção real de fraudar. E concentrar mais a sua atuação, quanto mais capacitado ele está, mais ele consegue identificar quem é de fato o contribuinte nocivo, quer promover a concorrência desleal, impedindo, por exemplo, que novas empresas entrem no mercado e pequenas empresas consigam se manter, porque promove, às vezes, devido à sua estrutura e ao seu poder econômico, uma concorrência que impede que os demais possam coexistir nesse ambiente comercial. Então, a capacitação habilita o auditor a expurgar esses mal contribuintes para que bons contribuintes tenham espaço e corrobore com o desenvolvimento econômico.

Grazi: Existem diversos mecanismos que grandes empresas usam para “fechar as portas do mercado” para pequenas ou novas empresas. Fazem isso para ter um monopólio do setor e com isso o poder de “ditar as regras”. Um mecanismo que usam para isso é justamente o abuso fiscal. Assim,   o trabalho das administrações tributárias é importante tanto para manter abertas as portas do mercado para os pequenos negócios, quanto para evitar o poder de monopólios.

Dani: João, o que é  preciso melhorar nas condições de trabalho dos auditores fiscais?

João: Eu diria que talvez um dos principais campos para a melhora tem relação com capacitação. Na área de ciência de dados, ciência da informação, nós precisamos de mais auditores capacitados nessa área para fazer link com o pessoal da tecnologia da informação. para fazer uma auditoria, mais aprofundada, maior conhecimento, maior capacidade tecnológica disponibilizada também para esses auditores, que é um outro fator importante, mas ele consegue chegar próximo da situação lá do fato gerador, das ocorrências de ilícitos, e consegue, com isso, promover maior justiça fiscal. A justiça fiscal está diretamente ligada à técnica do trabalho e boas políticas tributárias.

Grazi: Você disse que a justiça fiscal está ligada também às boas políticas tributárias.

João:  mas uma coisa interessante para que   promova-se boa educação fiscal também na sociedade. Desde lá da educação básica. Porque, com o cidadão consciente será instigado mais políticas tributárias que visam essa justiça social e combinando isso com o aprimoramento técnico da administração tributária, aí você caminha com o aprimoramento, uma melhoria mais significativa ainda da justiça fiscal.

Dani: João, na sua opinião, qual é a relevância do seu trabalho e do imposto em si para a arrecadação e alocação dos recursos com o objetivo de garantir direitos e combater desigualdades?

João: Não está errado quando a gente vê, por exemplo, que a gente paga muitos tributos, e a gente não vê o retorno disso. Vê a rua esburacada, tem serviços médicos de baixa qualidade. Isso realmente é compreensível  Mas o que nós temos que imaginar é o seguinte, que essa revolta está muito mais ligada à aplicação dos recursos do que à importância dos recursos. Os recurso tributários, eles é que tornam possível que os hospitais públicos existam, que as condições de segurança, de iluminação pública, possam existir, que as campanhas de vacinação e outras, também possam existir.

Dani: O imposto é um super poder fundamental para que vivamos como sociedade, de maneira mais solidária e justa!

Música de Encerramento

Grazi: Nossos heróis e heroínas seguem fortes e ativos no dia a dia da administração tributária. Com programas de educação fiscal, para as pessoas e pequenas empresas; e no combate ao abuso fiscal, inclusive enfrentando cenários alarmantes nas fronteiras. Para que sigam promovendo justiça fiscal é fundamental que tenham suas condições de trabalho aprimoradas, cursos de capacitação atualizados e frequentes, e remunerações dignas. É dever do Estado garantir essas condições. No É da sua conta seguiremos contando as histórias de nossos heróis e heroínas invisíveis. Desejamos que como sociedade aprendamos a valorizar cada vez mais quem diariamente trabalha para arrecadar os recursos públicos fundamentais para o bem viver das pessoas e do planeta.

Música encerramento

Grazi: O É da Sua Conta é coordenado por Naomi Fowler. A produção é de Daniela Stefano e minha, Grazielle David.  Um abraço e até o próximo.

Dani: Te desejo uma excelente continuação de manhã, tarde ou noite. Fica bem e até o próximo!


Outras Fontes

1

Fronteiras em colapso, um retrato da falta de estrutura da Receita Federal de norte a sul do Brasil

2

#56 Escola de heróis tributários

3

#44 Heróis invisíveis e em extinção

4

#33 – Heróis invisíveis 2 – o desafio global

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#32 –Auditores fiscais – heróis invisíveis
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